
Christiane Berlinck, vice-presidente de Recursos Humanos do Grupo OLX.
A OLX, um dos maiores sites de produtos usados do Brasil, acaba de implementar uma espécie de “fiscal” das conversas dos seus funcionários no chat interno da empresa no Slack.
Batizado de “Diversibot”, a novidade intervém nas conversas caso sejam usadas 124 palavras e expressões que podem “soar discriminatórias”.
A OLX não chegou a divulgar a lista completa de expressões. Questionada pela reportagem do Baguete, a empresa mandou dois de frases que geraram intervenções do Diversibot.
A primeira foi “achei que você era normal”, ao que o robô responde que: “Por que corrigir? Sabia que, segundo o IBGE, cerca de 24% da população brasileira possui alguma deficiência em diferentes graus? Então pressupor que um tipo de corpo é o normal (e, por isso, unicamente funcional) exclui todos os diferentes tipos de corpos que existem. Usado para descrever pessoas sem deficiência, implicando que pessoas com deficiência são anormais”.
O Diversibot sugere usar palavras como “típico” ou “comum”, no lugar de normal.
Outro exemplo surge a partir de "não vou judiar dela". Nessa ocasião, o robô aponta que o termo “judiar” é antissemitista, como "judiação" e "judieira" e recomenda usar alternativas como: maltratar, zombar, atormentar.
Segundo a empresa, no primeiro mês de utilização, em julho, foram 67 intervenções.
“É essencial evitar palavras e expressões discriminatórias que perpetuam estereótipos ou preconceitos, ou marginalizam grupos específicos. Acreditamos que a comunicação inclusiva é fundamental para criar um ambiente de trabalho onde todos se sintam valorizados e respeitados. A solução nos ajuda nessa jornada, promovendo a conscientização e o diálogo sobre a importância da diversidade”, explica a vice-presidente de Recursos Humanos do Grupo OLX, Christiane Berlinck.
(Berlink nao é uma novata em assuntos tecnológicos. Ela foi contratada em 2022, vinda de quase duas décadas de IBM, onde chegou a ser vice-presidente de RH para Brasil e América Latina).
Pelo contexto de uso (o Slack cria um ambiente mais informal de comunicação), a verdade é também que o Diversibot também pode ser interpretado de outras formas menos lisonjeiras pelos funcionários da OLX e a empresa tomou algumas medidas para evitar isso.
A primeira é que as mensagens do Diversibot são enviadas apenas para quem usou um dos termos listados, e não para todos os integrantes do grupo.
Na nota divulgando a novidade, a OLX também frisa que o Diversibot “não utiliza inteligência artificial”, o que é um caso inédito, visto que nos últimos tempos a maioria das empresas faz questão de atribuir basicamente tudo às maravilhas da IA.
A OLX não diz mais nada sobre esse aspecto de IA, mas uma interpretação do que eles querem dizer com isso é que a empresa não está fazendo análises mais aprofundadas sobre os padrões de comunicação dos funcionários.
“A ideia não é constranger ninguém, mas sim promover a educação e a conscientização. Por isso, a ferramenta envia mensagens apenas para quem usou o termo, garantindo que o aprendizado aconteça de forma individual e respeitosa”, afirma Berlinck.
De qualquer maneira, a OLX sim coleta informações em um dashboard, permitindo saber quantas vezes o Diversibot é usado e a respeito de quais termos (também não seria difícil anotar com quem, mas a empresa não chega a mencionar isso explicitamente).
COMO FOI FEITO
Os times do Grupo OLX que participaram do desenvolvimento desse projeto e da criação do nome “Diversibot” foram: TI, Diversidade, Equidade e Inclusão e os 5 grupos de afinidade da empresa como o de Mulheres, Parentalidade, Étnico-Racial, PCD e LGBT, que contribuíram na escolha das palavras.
A solução foi desenvolvida pelo empreendedor Augusto Pinheiro, CTO e fundador da Fluke, uma operadora de telecomunicações que aposta num modelo automatizado de atendimento.
“Como jovem da periferia, criei o Diversity Bot para a minha própria startup, para que as pessoas se sintam acolhidas e respeitadas. Eu vivi a exclusão de perto, e queria garantir que, na Fluke, todos tivessem a chance de trabalhar em um ambiente onde fossem valorizados e ouvidos. E, para ampliar o impacto, deixei o Diversity Bot código aberto para que outras empresas interessadas pudessem implementar a ferramenta em suas próprias operações”, afirma Pinheiro.
TENDÊNCIA?
A ideia de que chatbots são um bom local para promover ações de responsabilidade social corporativa parece estar em alta nos últimos anos.
Até agora, porém, as ações focavam na interação de usuários com robôs, e não em intervenções automatizadas em conversas entre duas pessoas.
O caso mais famoso veio do Google, cujo assistente virtual reage a interações consideradas inapropriadas por parte dos usuários desde 2022.
Em 2021 o Bradesco reprogramou o seu chatbot de atendimento aos clientes, que ou a dar respostas mais contundentes para contatos de clientes considerados ofensivos ou de assédio sexual.
Batizado de BIA e representado com traços femininos, o chatbot já recebeu 95 mil mensagens com conteúdo desse tipo só em 2020, revelou o Bradesco na época.
Também em 2021, a TIM fez 90 alterações no script do seu robô de atendimento virtual visando adotar uma linguagem mais neutra e diminuir a quantidade de palavras e expressões com “teor masculino”.
Assim, “Bem-vindo ao atendimento” virou “Você está no atendimento”, o que é um pouco mais seco, mas evita uma palavra de gênero masculino. “Nosso cliente”, ficou “Cliente TIM”; “Nosso atendente” agora é “Nossa equipe”.