
João é o novo guia do Waze. Foto: Pexels.
O Waze definiu uma voz masculina como guia padrão do aplicativo de navegação no Brasil.
A voz gerada por computador ganhou o nome apropriadamente anônimo de João e estará disponível a partir do dia 14.
Quem quiser seguir dirigindo sob o aconselhamento cálido de Alessandra, uma voz gerada por computador em timbres femininos, precisará escolher essa opção no app.
(As modificações tem também um viés mais prático: o novo app traz retificações na pronúncia de nomes de ruas, avenidas e rotas em português, que antes eram ditos de forma errada ou pouco compreensível).
O Waze não chega a contar vantagem sobre isso na sua divulgação para a imprensa, mas a troca do padrão de voz do app é uma medida de cunho feminista.
Entender o porquê disso exige conhecer as minúcias do debate sobre assistentes virtuais e chatbots, o que acabou se tornando um hobby desse repórter.
Para alguns críticos e especialistas no assunto, as escolhas das empresas sobre os seus sistemas de atendimento reproduzem e ajudam a perpetuar velhos estereótipos sobre os papéis sociais de homens e mulheres.
Teses à parte, o fato é que existe um claro padrão nesse assunto. Os exemplos de assistentes femininas são dezenas e incluem, tanto produtos famosos, como a Alexa da Amazon, ou nomes nacionais como a Aura, assistente da Telefônica, a Carol (Totvs), Lia (Leroy Merlin), Duda (Algartech), Vivi (Vivo) e Júlia (TAM), só para citar algumas.
Os nomes e personagens masculinos são a exceção da regra, como o Roque, do Roque in Rio, o Edu, da Anima Educação, ou ainda, aquele que é o melhor nome de chatbot do Brasil na opinião do Baguete: o Paraná Inteligência Artificial (PIÁ), do governo no Paraná.
Para estudiosos do assunto, essa prevalência de personagens femininos entre os chatbots é uma adequação mais ou menos consciente das empresas à ideia de que o papel das mulheres é atender os desejos de outros, o que reforça os chamados problemas de gênero.
Essa teoria é reforçada pelo fato de que quando uma empresa de tecnologia desenvolve uma AI que quer destacar pela inteligência, com perdão da redundância, o nome e a voz são masculinos, como o Watson da IBM (cinéfilos podem citar também o HAL9000, o robô assassino de Uma odisséia no espaço, que não existe na vida real, mas tudo bem).
Os problemas de gênero, por sua vez, são um dos fronts na luta contra as desigualdades raciais, sexuais e de gênero, uma bandeira em alta na pauta de responsabilidade corporativa das grandes corporações.
Assim, recentemente a TIM revisou toda a linguagem usada pelo seu chatbot, priorizando as chamadas “expressões neutras”, nas quais não se usa o coletivo masculino
O Bradesco reprogramou o seu chatbot de atendimento aos clientes, que ou a dar respostas mais contundentes para contatos de clientes considerados ofensivos ou de assédio sexual.
Tanto a TIM quanto o Bradesco, no entanto, mantiveram as identidades femininas das suas atendentes.
O UP Consórcios, fintech da Embracon, foi mais longe e lançou o que chama de "o primeiro assistente virtual não binário do Brasil".
Não binário no caso não quer dizer que o robô prescinde do princípio binário por trás dos programas de computador (o que pode ser até impossível), mas que ele tem uma identidade de gênero não necessariamente masculina ou feminina.