
Zaima Milazzo, presidente do Brain, centro de inovação fundado pela Algar Telecom.
Um país novo, com extensão territorial bastante limitada, mercado interno reduzido, altíssima escassez de recursos naturais, inserido em conflitos históricos, sem parceiros comerciais no seu entorno – e, mesmo diante de tudo isso, considerado a grande “nação das startups”. Com um ecossistema mundialmente reconhecido, Israel enxergou na inovação uma forma de vencer no jogo, superar barreiras e provar que é possível triunfar apesar de cenários adversos. Alguns ingredientes da receita para seu sucesso pude conferir de perto recentemente, quando tive a oportunidade de realizar uma formação executiva voltada para a estratégia de inovação na Universidade de Tel Aviv.
Um desses ingredientes é a força existente na diversidade. Sua população de 8 milhões de habitantes é extremamente heterogênea, uma vez que é composta por pessoas originárias das mais diferentes nacionalidades que se juntaram pela religião. Apesar de terem o judaísmo em comum, vejo que suas múltiplas culturas e histórias, vindas de todas as partes do globo, contribuem e muito para dar a Israel uma riqueza: distintas visões e formas de pensamento, tão importantes para estimular o olhar “fora da caixa” que buscamos para conseguir inovar.
Outro ponto importante que contribuiu para que Israel conquistasse essa posição de liderança em inovação é a maturidade dos seus profissionais. Uma vez que servir ao exército é uma obrigatoriedade, as pessoas ingressam na universidade mais tardiamente. Além disso, eles têm como costume viajar pelo mundo enquanto ainda são jovens. Assim, quando finalizam suas formações e entram no mercado de trabalho, já têm uma bagagem de vida considerável e maior maturidade, o que ajuda na questão do empreendedorismo. Afinal, quanto mais maduro um empreendedor, melhores as chances de sua startup dar resultados.
Agregada a isso, entra a educação como a base da cultura judaica. Desde cedo, as crianças são a todo momento estimuladas a questionar e não aceitar respostas prontas dos professores. No estudo religioso, por exemplo, o método de ensino envolve pegar cada princípio e debatê-lo a exaustão, sem medo de desrespeitar hierarquias. Essa cultura livre e questionadora é justamente a semente da inovação, pois envolve não aceitar regras, buscar caminhos não óbvios e formas diferentes de enxergar o mundo e aquilo que já nos é dado como pronto e certo.
É fato que a diversidade, a maturidade e o perfil questionador dos israelenses são fatores que contribuíram significativamente para que eles chegassem onde estão. Porém, acredito que a alavanca essencial para que a inovação decolasse tenha sido a tríplice formada por universidades, poder privado e poder público. Lá o governo investe nas startups e tem, inclusive, um órgão responsável por fazer a análise de oportunidades mesmo que elas estejam ainda em estágio embrionário. Aportando o investimento que o empresário tanto precisa nessa fase inicial, ele realmente consegue tirar a ideia do papel.
Agindo de maneira integrada por interesses comuns, essa tríplice têm feito apostas mesmo sabendo que, em média, só 5% das startups conseguem entrar em outros estágios de investimento. Eles investem independentemente da taxa de insucesso, pois sabem que cada 1 dólar que colocam nesse mercado se transforma em nada menos do que 8 dólares em geração de empregos e novos negócios, uma conta que vale muito a pena. Essa estratégia se mostrou tão eficiente que hoje têm 200 ventures para uma população de 8 milhões de habitantes, com cases de sucesso como a compra, por US$ 15,3 bilhões, da israelense Mobileye pela fabricante norte-americana de chips Intel.
No Brasil, infelizmente ainda estamos longe dessa conexão tão bem estabelecida entre as três frentes, mas o Porto Digital de Recife é um bom exemplo dos frutos conquistados quando universidade, iniciativa privada e governo trabalham em conjunto. Israel tem muito a nos ensinar com seu modelo de inovação, mas também temos algo a oferecer. Sendo um país com dimensões continentais, nosso mercado interno é um terreno fértil para escalar suas startups.
Os israelenses estão realmente criando soluções disruptivas que podem mudar o mundo de várias maneiras. E nós temos potencial não só de aprender como também de criar parcerias para embarcar nessa transformação junto com eles.
*Por Zaima Milazzo, presidente do Brain, centro de inovação fundado pela Algar Telecom.