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Felipe Basso.
O escritor e colunista do Baguete, Felipe Basso, é um dos finalistas do Prêmio AGES Melhor 2015, na categoria crônica, com o livro Maria volta ao bar.
Na categoria, também concorrem Fabrício Carpinejar, com Segredos de um violino e Diana Corso, com Tomo conta do mundo: Confissões de uma psicanalista.
Maria volta ao bar é uma homenagem ao 50 anos de falecimento do cronista e compositor Antônio Maria, celebrado no ano ado.
Organizado pelo escritor e músico Rubem Penz, o livro foi elaborado pelos cronistas da oficina literária Santa Sede, que acontece semanalmente no Bar Apolinário, na Cidade Baixa, em Porto Alegre.
A obra busca recuperar o espírito da boêmia carioca dos anos 50, na qual Antônio Maria era uma figura de destaque.
O escritor pernambucano ficou conhecido pela sua inteligência e pela fina ironia na sua atuação como jornalista em publicações o Globo e Última Hora,, radialista na Tupi e apresentador de programas na então iniciante televisão brasileira.
Tem mais de 3 mil crônicas escritas, em livros como Seja feliz e faça os outros felizes e Benditas sejam as moças. Além disso, ficou famoso pela canção Ninguém me ama (“Ninguém me ama, ninguém me quer / Ninguém me chama de meu amor”).
Além da crônica, também são premiados livros nas categorias Infantil, Juvenil, Não-ficcão, narrativa, narrativa longa, poesia e especial.
O resultado será anunciado dia 11 de julho, em uma cerimônia no auditório Barbosa Lessa, no Centro Cultural Erico Veríssimo. Abaixo, a crônica de Basso na íntegra:
Quando eu era madrugada
“O homem só tem duas missões importantes: amar e escrever à máquina.
Escrever com dois dedos e amar com a vida inteira.”
Amanheci calado. Amanheci e permaneci calado. Eu não sei se aram dias, meses, se se aram anos. Os amigos perceberam o meu silêncio e comentavam entre si: que diabos tinha acontecido com aquele cara?
Amanheci e não busquei o cigarro. Amanheci e não levantei da cama. Não saí de dentro de mim. Amanhecera, mas eu ainda era madrugada.
Amanheci e, assim, sem palavras, recusei displicente o convite para padrinho do casamento. O compadre que me perdoasse, mas, naquele dia, me era impossível.
Amanheci já disposto a recusar todo e qualquer trabalho, mesmo precisando saldar dívidas mortificantes. Os credores que me executassem, mas era imprescindível que eu permanecesse deitado. Eu não levantaria, mesmo que para honrar compromissos.
Amanheci morto. Sem espaço.
Amanheci e deixei a página em branco.
Amanheci sem ninguém ao meu lado.
Eu te procurei, ansioso e tardio, eu te procurei em todos os lugares – bares, igrejas, hospícios – porém, te busquei por caminhos sinuosos e fui tolo em não perceber o que estava bem à minha frente.
Você estava ali o tempo todo. O tempo é que não estava conosco. Quase sempre, o tempo é fulminante com quem se descuida, se não estivermos atentos, de repente, é noite.
Nosso Senhor, entretanto, é misericordioso com aquele que aceita a dor que lhe compete. E me deu uma segunda chance. Eu havia me perdoado.
Naquele instante, me foi concedida a eternidade. Essa eternidade que só os amantes conhecem e que um dia eu também havia conhecido, mas da qual me esquecera completamente. Essa eternidade que eu havia recusado por acreditar em verdades ignorantes.
Agora, entendo. Amar não é uma questão de tempo. Amar é jamais deixar a página em branco.